segunda-feira, 17 de outubro de 2016

O Leão de verdade, o verdadeiro rubro-negro

Um a zero pode parecer um placar monótono à primeira vista; às vezes, no entanto, é prudente olhar melhor. Grandes perfumes podem estar contidos em pequenos frascos, e grandes vitórias por vezes podem se esconder em placares apertados. 

Foto: Blog do Torcedor

Quem examinar com mais atenção o Sport x Vitória de ontem à noite pode se surpreender com o que vai descobrir. Em uma palavra, o Sport jogou com raça porque só lhe interessava a vitória. Pouco antes o Flamengo perdera do Internacional; o velho Urubu, arremedo de rubro-negro, não conseguiu segurar nem mesmo o Colorado que passou praticamente o campeonato inteiro na sarjeta. Pior: perdeu de virada. O Internacional deu, neste jogo, a demonstração de coragem e valentia que não dera no campeonato inteiro. Se é coisa estranha um vice-líder perder para um time do Z4, ainda pior é perder após ter estado ganhando. E pior, mil vezes pior, é sofrer uma derrota assim, bruta e avassaladora, humilhante e embaraçosa, enquanto ostentava em campo o uniforme vermelho e preto que o Sport, com seu uso, glorificou e tornou sagrado. O Flamengo emporcalhou a camisa rubro-negra; cumpria então ao Leão da Ilha salvar-lhe a honra.

E assim o fez. Sim, o motivo da vitória do Sport -- da vitória colossal e retumbante que o fez saltar três posições na tabela -- não esteve tanto na imperiosa necessidade de vencer, uma vez que a derrota o lançaria em uma humilhante décima-sétima posição. Não esteve tanto no clamor da torcida, que com generosidade, com ânimo, com paixão, compareceu em peso à Ilha do Retiro para empurrar o time pra frente. Não esteve tampouco no empenho de Daniel Paulista, cuja estréia não lhe poderia ser mais favorável. Nada disso. O verdadeiro motivo da vitória do Glorioso, senhoras e senhores, foi este: o sagrado manto rubro-negro havia sido ultrajado pela pelada que jogou o Flamengo, e oferecer-lhe um desagravo era questão básica de justiça. A coisa pedia, exigia, clamava uma satisfação. 

E não importava, naquele momento, nada. Não interessava desapontar ou alegrar a torcida; não fazia diferença o técnico começar com o pé direito ou com o pé esquerdo. Não importava nem mesmo a posição que o Sport passaria a ocupar na tabela do campeonato. A única coisa que importava, naquele momento tenebroso, naquele jogo fatídico, era reparar a ofensa que o urubu carioca recém fizera ao uniforme rubro-negro. O Flamengo arrastara na lama o vermelho e o preto; o Sport precisava, assim, fazê-lo tremeluzir, imponente, rútilo, nas alturas.

E o fez com maestria e classe, contando tanto com a habilidade dos seus jogadores quanto com a cumplicidade dos seres cósmicos. Porque não bastou Diego Souza fazer um golaço logo no início do jogo; foi também necessário fechar o gol rubro-negro, impiedosamente alvejado por não apenas um, mas dois pênaltis seguidos. Marcados com menos de cinco minutos de distância entre um e outro. Nunca se viram duas penalidades máximas favoráveis ao mesmo time tão próximas entre si. Mas mais que isso: nunca se viu um gol permanecer tão incólume, tão impávido e inexpugnável, tão íntegro, tão fechado, após o duplo assalto de dois pênaltis consecutivos.

Zé Love bateu o primeiro pênalti sem contar com Magrão. Não é um simples goleiro, é uma virtuose de deixar boquiabertos os que se encontram diante dele. O pênalti foi batido com categoria, com habilidade, com precisão; muito mais preciso, no entanto, muito mais habilidoso e categórico foi o goleiro do Sport, que mergulhou para preservar a rede rubro-negra de uma forma que ninguém acreditou que pudesse ser possível. O segundo pênalti ficou sob a responsabilidade de Kieza; contra este levantaram-se até mesmo as próprias estruturas da Ilha do Retiro, como se o campo mesmo tomasse sobre si o encargo de manter inviolado o gol rubro-negro. A trave impediu a bola de Kieza de entrar; e se acaso a trave falhasse, já Magrão estava lá, voando em direção à bola, preparado para não a deixar passar nem mesmo sobre o seu cadáver monumental. Nem a primeira bola nem a segunda entrou, e dali até o fim do jogo nenhuma outra teve sequer esperanças de lograr êxito onde dois chutes tão avantajados sofreram tão fragoroso fracasso. 

E a vitória assim se impôs. O Sport vitorioso sobre o Vitória, cujo nome não lhe serviu naquela noite. Apenas um Leão é o verdadeiro rei, e o Glorioso soube fazer valer a sua majestade sobre o falso rei baiano. E principalmente, principalmente!, o uniforme rubro-negro foi honrado, glorificado, tratado com o respeito que merece. Vencendo o Vitória, o Sport mostrou ser o Leão de verdade; vingando a derrota do Flamengo, provou ser o verdadeiro rubro-negro. 

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